quinta-feira, 31 de dezembro de 2009

40º e último post de 2009!

Não pretendia escrever outro post tão cedo, mas reparei que 39 posts foram escritos em 2009, e quis completar 40! sendo hoje o último dia do ano, não tinha como adiar... rsrs
E como não me resta mais criatividade pra escrever, vou deixar um pouco de Caio pra vocês.. afinal, é sempre bom um pouco mais de Caio!!! Aliás, todos deveriam amar Caio...

"Não consigo ver mais que isso: essa é a lembrança. Além dela, nós conversamos durante muito tempo na chuva, até que ela parasse, e quando ela parou, você foi embora. Além disso, não consigo lembrar mais nada, embora tente desesperadamente acrescentar mais um detalhe, mas sei perfeitamente quando uma lembrança começa a deixar de ser uma lembrança para se tornar uma imaginação. Talvez se eu contasse a alguém acrescentasse ou valorizasse algum detalhe, assim como quem escreve uma história e procura ser interessante — seria bonito dizer, por exemplo, que eu sequei lentamente os seus cabelos. Ou que as ruas e as árvores ficaram novas, lavadas depois da chuva. Mas não direi nada a ninguém. E quando penso, não consigo pensar construidamente, acho que ninguém consegue. Mas nada disso tem nenhuma importância, o que eu queria te dizer é que chegando na janela, há pouco, vi a chuva caindo e, atrás da chuva, difusamente, uma roda-gigante. E que então pensei numas tardes em que você sempre vinha, e numa tarde em especial, não sei quanto tempo faz, e que depois de pensar nessa tarde e nessa chuva e nessa roda-gigante, uma frase ficou rodando nítida e quase dura no meu pensamento. Qualquer coisa assim: depois daquela nossa conversa depois daquela nossa conversa na chuva, você nunca mais me procurou. "
["Do outro lado da tarde" em O Ovo Apunhalado - Caio Fernando Abreu]


FELIZ 2010!!!!!

terça-feira, 29 de dezembro de 2009

Ano novo...


2009 acabou. Mas velhos hábitos nunca mudam. Parar na janela pra ver as coisas acontecendo é o meu vício particular – e preferido também. É o momento em que consigo parar, respirar, deixar a cabeça pensar no que quiser e sentir que faço parte de algo muito maior. E que algo maior ainda faz parte de mim. É olhando pra fora e observando o mundo – milimetricamente projetado pra nós – que me sinto mais próxima e muito mais intima do mundo que distraidamente projeto dentro de mim. O mundo que crio falando desesperadamente, derramando amor pela portaria, suspirando memórias, colecionando amigos, rabiscando papéis e bebendo xícaras intermináveis de café. Só que nessa noite, senti todo esse excesso dentro de mim transbordando e a janela do meu quarto não me saciou. Queria ver o mundo de camarote. Fui então ver o mundo da varanda. E lá estavam a minha rua, o meu bairro e a paisagem que estou tão habituada a observar silenciosamente. A proximidade do Réveillon esvaziou a cidade. A rua ta parada e as luzes de natal começando a sumir. Acontece, que toda essa falta de movimento e o silêncio ensurdecedor vindo de fora me fazem sentir saudades de pessoas que nunca me pertenceram. Me machuca não ver estranhos que não conheço, e a falta de qualquer forma de vida la fora me dói um pouco. Porque hoje estou mais sensível. Culpa dessa sensação de nostalgia que, nos fazendo bem ou mal, sempre mantemos por perto quando chega o fim do ano. Ciclos se fecham e a ansiedade para os novos que vão se abrir é inevitável. Mas o ano passou e mesmo que eu esteja mais em silêncio que o normal, cansada dos amigos, do telefone e do calor infernal, a verdade é que em 2009 eu não fiquei mais magra, não parei de fumar, não fiz um esporte, não fiquei mais calma, mais serena nem mais rica. E eu ainda amo demais, ainda me encanto com os mais esquisitos, ainda escrevo pra tornar eterno o que penso, ainda gosto de ver a vida lá fora e ainda não sei o que de fato mudou nem o que vai mudar no próximo ano. Então não acho que em 2010 conseguirei ser diferente, mas prometo tentar um pouco mais. E abro meus braços pra esperar o ano que vai chegar com a única certeza de que continuarei aqui, no meu camarote particular, vendo o movimento (ou não) la de fora e tentando enteder o daqui de dentro. Afinal, velhos hábitos nunca mudam...

[Velhos temas também não... hehehehe]

Feliz ano novo!

quinta-feira, 24 de dezembro de 2009

Então é Natal...

A última semana de Dezembro sempre me tirou o sono. Não por esperar ansiosa a chegada do Papai Noel. Mas porque todo o frenesi, acompanhado de caixinhas de presentes e luzes espalhadas pela cidade, me causa claustrofobia e esfrega na minha cara o inevitável: A chegada do Natal. Papai Noel de shopping, jingles terríveis em várias versões e pinheiros que de repente se multiplicam mesmo estando em uma cidade tão quente como a minha. Surgem para aumentar a ânsia pelo meu aniversário que chegará em breve e para me lembrar que tenho que preparar o estômago pra engolir o “excêntrico jantar de natal” que me espera.

Deixei de gostar das comemorações natalinas desde que adquirir maturidade suficiente pra entender que o Natal serve apenas para juntar parentes distantes. Por pura obrigação e não por ser uma época de alegria e confraternização. Primos de não-sei-que-grau te pentelhando e tias-avós fazendo perguntas inúteis sobre como vai a faculdade e o emprego. Sem contar a mais clássica de todas: “Está namorando?”. Que inferno! Se esse interesse pela minha vida fosse de fato verdadeiro, porque não me ligaram durante os 360 dias que tiveram pra saber como andam as coisas ao invés de acumular perguntas pra acabar com minha paciência durante a ceia de natal?

A gente cresce, aprende que papai Noel não existe, mas mesmo assim continua a celebrar sabe-se lá o que. O nascimento de Jesus já não cola mais. Afinal, no meio de bebidas, comidas, amigos ocultos e tios gordos fantasiados, quem se lembra de mencionar o nome de Jesus?! Talvez a prima adolescente faça algum comentário sobre o namoro da Madonna. Mas nada, além disso.

Acontece, que as caixinhas de presente continuam a se multiplicar e as músicas de Natal me perseguem até em sonho. Mas aos 20 anos, já faço parte da classe dos adultos-que-não-ganham-presente-porque-entendem-que-presente-é-só-pras-crianças. Às vezes até acontece de algum parente distante (tão distante que eu nem sei qual o nosso grau de parentesco) chegar com um presente nas mãos porque “não é legal chegar à casa dos outros de mãos vazias”. E pra não fazer feio, me presenteia com um porta-retrato barato ou uma agenda para o próximo ano. (Eba!)

Mas no meio disso tudo, sinto a nostalgia do ano que está acabando e conto os dias para um outro que já está chegando. 2009 arrancou minha imaturidade a fórceps, me escolheu novos amigos, me deu novos vícios, me fez fazer as pazes com o tempo e jogar fora papéis, pessoas e velhos hábitos. Talvez no fundo pouca coisa tenha mudado. Afinal, eu sou o resultado de todas as minhas memórias, e de toda a esperança do que ainda está por vir. Mas o pouco que mudou, mudou pra vida inteira, e me despeço dos 20 anos uma pessoa um pouco melhor. Então tá tudo certo. E passado o desespero, desejo a todos um Natal, no mínimo, farto de comidas tradicionais natalinas. Porque elas sim valem a pena...

terça-feira, 22 de dezembro de 2009

Um masoquismo feminino nada original.

Quando acordei, vi que o celular estava estático do meu lado. Nenhuma ligação perdida. Senti o peito apertado e uma vontadezinha de chorar. Foi o primeiro sinal de que a TPM estava de volta. Em dias assim, preciso prestar muita atenção no que faço, falo, vejo ou escuto. Porque tudo, de repente, começa a ter um poder descontrolado sobre mim. E mesmo sabendo disso, escolhi acordar e escutar Billie Holiday pra me maltratar logo pela manhã. Pra fazer os olhos molharem e os cabelos dos braços arrepiarem. Este foi o segundo sinal do dia. Na certa será uma TPM regada a chocolate, músicas nostálgicas, meia dúzia de comédias românticas ou qualquer outra coisa que quebre a pose de durona e me faça refletir sobre perguntas sem a mínima possibilidade de resposta. Melhor assim. Chorinho recatado, romantismo barato e emoção exagerada. Com tanto problema acontecendo, eu não daria conta de passar por uma TPM “exorcista” que me fizesse vomitar verde, girar a cabeça e gritar que vou comer seu fígado com ervilhas por não ter ligado...

quarta-feira, 16 de dezembro de 2009

Sonho.

"Mas a ilusão
Quando se desfaz
Dói no coração
De quem sonhou, sonhou demais
Ah, se eu pudesse entender
O que dizem os seus olhos"

[João Gilberto]


Sonhei que tentava decifrar seus olhos. Olhos de menino que acaba de descobri o mundo. Tanta coisa escondida. E eu ali. Observando você me olhar e tentando extrair qualquer significado escondido nos seus olhos. Sussurrava em seu ouvido, pedindo uma dica, enquanto minhas mãos apertavam sua nuca. Sussurrava pra enganar o silêncio. Pra tentar transformar em palavras o que seus olhos me negavam. E quanto mais me fitava, mais eu enterrava minhas unhas no seu pescoço. Como se eu tentasse arrancar a força alguma explicação. Te puxei pra mais perto porque queria ouvir seu silêncio noturno. E enquanto eu estava me sufocando com a necessidade de decodificar cada pensamento seu, você passou suavemente a mão pelo meu rosto. E foi o suficiente pra me fazer afrouxar os dedos enterrados na sua pele. Passou a mão pelo meu rosto e eu quis que minhas mãos coubessem no meio das suas. Me olhou mais uma vez. E eu sabia que aquele olhar queria me dizer algo. Algo que eu não conseguia entender. E que por algum motivo sua boca não conseguia dizer. Tentei decifrar tão intensamente seus olhos que tinha perdido a conta do tempo e a noção de espaço quando acordei. Acordei e os dedos doíam. A falta do seu peso sobre mim e o quarto vazio doíam também. Na boca, um gosto de angústia nauseante,somado ao gosto amargo da frustração de não conseguir decifrar o que em sonho tentou me dizer o seu olhar.

sexta-feira, 11 de dezembro de 2009

Neste Natal faça meu ego feliz..

vá na barra lateral e clique em "Seguir"!!!

^^

domingo, 6 de dezembro de 2009

Quem diria...

Celine: Memories are wonderful things, if you don’t have to deal with the past.
[Before Sunset - filme]

Quem diria. A gente se encontrar para um chope alguns anos luz depois. E tudo parecer igual apesar de estar tudo diferente. A calma dele fora do comum e a minha hiperatividade constante. O cheiro dele fora do comum e a minha bagunça gritante, e ele continua lindo. Uma beleza que fere os olhos. Mas que desta vez não me desconsertou e foi fácil admira-la sem qualquer constrangimento. Porque pela primeira vez em anos pude ver de perto, bem perto, que os opostos se atraem mais jamais se misturam. E o que era meio virou nada. As meias decisões, a meia vida em comum , os acontecimentos pelo meio, o meio de tudo - o medo de tudo - e nós que ficamos pelo meio, de repente, ali, numa mesa de bar virou nada. O que pra minha sorte – e pro alívio dele - finalmente aconteceu.
Quem diria. 4 anos. Às vezes parece que foi ontem, às vezes que foi há mil anos. E a gente de repente se encontrar para um chope. Depois de muita coisa, de muito tempo e de muitas pessoas. E poder ver que algumas coisas permanecem iguais, outras um tanto diferente. Fazia uma noite linda de enjoar. E velhos amigos estavam reunidos e arregalando os mesmos sorrisos que há tanto tempo eu não via. Me fazendo perceber que no passado a única coisa fora do lugar era a gente mesmo. Agora a única marca da presença dele na minha vida são as fotos escondidas e as lembranças. E lembranças são apenas coisas que já foram e não que continuam sendo. Sabendo disso fica fácil lidar com elas. Mais ainda gostar delas. Porque não é pecado nenhum apreciar as lembranças de uma vida que foi, mesmo que não exista mais forma de voltar a sê-la. Uma lembrança sem dor, pelo contrário, uma lembrança boa e feliz. Porque agora eu sei que aquela beleza irá ferir eternamente meus olhos, mas nunca mais meu coração.

quinta-feira, 3 de dezembro de 2009

E você que se vire com isso...

“Cada voto que fiz ergueu-se em grito contra o meu próprio dar demasiado.”
[Vinicius de Moraes]


Olhar pra frente e ver o mundo indo e decidir ir também. Cada um tem seu problema, isto é certo. Mas problema maior é ficar parado. Estacionado em uma situação que não te leva mais a lugar nenhum. Que não lhe permite tirar mais nada de proveito. E ter a certeza disso nem sempre é tarefa fácil. É preciso maturidade pra seguir em frente e acompanhar o fluxo do mundo que bem ou mal, vai. Uma maturidade que nos força a nos afastar de situações de risco (principalmente pro coração) mesmo quando um lado nosso bate o pé no chão – como criança- e repete incansavelmente que quer. E ainda temos que lutar contra a vontade de passar por cima da regra de ouro e ir com tudo pra cima sem medir conseqüências. É preciso caminhar pra dentro e reconhecer-se, pra conseguir caminhar pra fora sem medo de cair, ou mais ainda, pra ter inteligência pra prever o tombo. Eu não previ meu tombo, mas também não tive medo de cair. E agora que me preparo pra levantar sinto que me minha cabeça não sabe nada, mas o meu corpo sabe exatamente onde dói. E travo uma luta interna com essa maturidade que julgo ter. Porque me questiono quando que ficar sozinha em casa no sábado virou um programa agradável. E mais ainda quando o agradável, pra mim, ganhou peso menor do que o necessário. Acho que foi quando tudo começou a virar um cenário patético demais para que não fosse mudado. Tudo tão demasiadamente ridículo que senti uma saudade imensa da época em que curava meus problemas com insônia, madrugadas regadas a litros de café, jazz e textos no blog. E por isso, hoje, escrevi versos, parágrafos e transformei tudo em texto. Recordei frases feitas, olhares perdidos, momentos de silêncio e vi que durante um tempo, deixei um lado valioso meu de lado. Revirei livros já lidos, recomecei aqueles que já comecei uma dezena de vezes mas nunca terminei - como quem tentasse resgatar o que ficou. E sem conseguir mais me conter, escrevi sobre você. Porque é só quando te transformo em letra que te sinto de verdade. Não como ser presente, mas como lembrança viva de tudo o que não fomos. Acontece, que o mundo vai e eu preciso ir. Mesmo que o lado que bate o pé como criança querendo ficar esteja me deixando louca e transformando numa tarefa árdua caminhar pra frente sem olhar pra ver o que ficou pra trás. Mas o mundo vai e eu também preciso ir, querido. E você que se vire com isso...

terça-feira, 1 de dezembro de 2009

Leite com achocolatado.


Acordou com o corpo suado, levantou cambaleando, foi até o banheiro, lavou o rosto e depois chegou até a janela pra conferir como estavam as coisas la fora num dia quente de sol senegalês. “O mundo ta pegando fogo” – pensou ele. O celular estava estático em cima da mesa. Ele sabia que ela não tinha ligado, mas ainda assim preferiu conferir e ver se não tinha nenhuma ligação perdida. Nada. Claro, ela não é desse tipo de mulher, que liga pra pedir palavras de carinho ou pra perguntar como ele está. Não ia ligar assim à toa. Questionou o relacionamento que tinham. Ela é auto-suficiente, bem resolvida, mora sozinha e tem um cachorro que a faz companhia. O que deixa nele uma profunda sensação de ser só mais uma coisa pra ocupar o tempo dela. Nada de especial. Como um brinquedo ou uma forma de distração da vida corrida. Resolveu tomar uma xícara de café pra ver se acostumava com o gosto. Ela só toma café e estava cansado de vê-la tomando xícaras ao acordar enquanto ele se mantinha no leite com achocolatado. Procurou nos armários e encontrou um vidro de café instantâneo que ela comprara pra deixar na casa dele pra quando fosse dormir por la. No rótulo estava escrito Extra Forte, o que não o animou muito. Mas estava decidido, seria café quente numa manhã quente, mesmo ele não entendendo a lógica disso. Com o café já pronto nas mãos, caminhou até a sala e no instante em que tentou dar o primeiro gole reparou que a luz da secretária eletrônica piscava. Apertou o botão para escutar o recado e surpreendeu-se ao ouvir a voz dela saindo do aparelho. Sentado no sofá com a xícara de café na mão, ele escutava pela secretária eletrônica o recado que ela havia deixado na noite anterior. Se disse preocupada porque fazia uma noite quente e queria saber como ele estava lidando com todo calor. Sabia como noites quentes o incomodavam. Às vezes esses ataques de proteção surgiam e se alteravam com um profundo descaso da parte dela que era capaz de ficar dias inteiros sem ligar e depois dizia que essas inconstâncias emocionais eram a maior prova de amor que ela podia dar. Ele não se mexeu. Permaneceu no sofá, fazendo careta ao tentar tomar seu café e ouvindo a voz dela, abafada pelo barulho de trânsito, dizendo que estava preocupada. Aquilo lhe deixara confuso. Tinha calculado a noite inteira enquanto rolava na cama sem dormir em função do calor, o momento ideal para deixá-la. Estava cansado com a inconstância, a independência e a personalidade forte dela. Tudo isso o deixava inseguro demais. Não dava pra acordar com uma mulher que bebe café instantâneo Extra Forte pela manhã enquanto ele bebe leite com achocolatado. Essa insegurança faz o amor acabar. Inevitavelmente. Mesmo que pra ela insegurança não fosse um motivo plausível, pra ele era motivo suficiente. Tentou programar o que dizer. Pensou na forma com que o cabelo dela cai sobre o olho escondendo metade do rosto como se assim protegesse dele metade dela. E em como ela gosta de dormir com cobertores diferentes para que nem um deles destape o outro durante a noite. E como gosta de passar a xícara de café perto do nariz antes de bebe-lo pra poder sentir seu aroma. E lembrou de cada pequeno detalhe que a fazia especial pra ele. E percebeu que estas pequenas coisas, as pequenas manias dela estavam tão impregnadas nele que ele precisaria de um tempo longe, um tempo sozinho pra poder se livrar do vicio. Fazer uma desintoxicação. Para isso era preciso primeiro conseguir deixá-la. Ele não a entendia direito. Enquanto pessoas normais viram a cara para possíveis tentações, ou para alguma coisa que esteja do outro lado da rua, ela não, ela é do tipo de mulher que atravessa no meio dos carros pra ver o que tem do outro lado. Neste instante começou a cair uma chuva dessas de verão, que sempre caem depois do calor. A mensagem na secretária repetia pela terceira vez, ele permanecia no sofá e a xícara de café permanecia cheia. Sentiu o cheiro do café e viu que enquanto vivesse lembraria dela ao sentir aquele aroma. Levantou num pulo, desligou a secretária e pegou o telefone num desses momentos em que as coisas fazem sentindo. Largou a xícara de café, ligou pra ela e disse que estava indo vê-la. Antes de sair, tomou um copo de leite com achocolatado bem gelado e saiu, pensando que se um dia ela quisesse ver o que tivesse além, o que tivesse depois dos carros, que fosse ele esperando por ela do outro lado da rua.

segunda-feira, 23 de novembro de 2009

Verão


Têm feito dias de sol. E um dia desses, reparei que a praia de Camburi anda acordando linda em baixo de um sol brilhante e um céu incrivelmente azul. São poucas às vezes, confesso, que paro para admirar a beleza da cidade onde eu vivo. A cultura, os jeitos, as gírias, os olhares, nada aqui combina comigo. E o meu desprezo por tudo isso ofusca minha capacidade de ver simplesmente por ver. Olhar em voltar e ver como é simpática a ilha de Vitória. Mas sobre me sentir estrangeira na cidade onde nasci é uma conversa pra outro texto. Independente disso, Camburi acordou linda. Tão linda que me deu uma vontade louca de ter uma bicicleta pra poder passear pela orla admirando o tempo bom que tanto faz bem ao meu humor. Parece que o verão chegou de fato. Lá fora e aqui dentro também. A sensação de calma, de paz, alegria e de reflexão, me faz sentir como uma criança que brinca livre na areia da praia, sem se preocupar com o sol, construindo castelos de areia que desabam de forma divertida quando bate a água do mar e limpa o terreno para que um novo castelo seja construído. Castelos dentro de mim estão desabando, e de forma divertida, como os de areia que as crianças fazem na praia. É divertido porque o verão aqui dentro me mostra que é preciso estar sozinha por um tempo, é preciso limpar o terreno para construir um castelo novo. Me mostra depois das dores, as delícias de me ter como companheira de quarto. E me faz parar de teorizar o amor mesmo que a prática ainda me enlouqueça. Estar só e em silencio é um alto aprendizado. Por vezes doloroso, mas grandioso. Tão grandioso que em dias assim, onde a praia de Camburi acorda linda em baixo de um sol brilhante e um céu incrivelmente azul, eu acho divertido ver meus castelos caindo, e meus medos e meus pudores caindo junto. E não me importo em dizer que estar sozinha também é bom. E que é natural, às vezes, querermos passar mais tempo dentro de nós do que dentro deles. Mesmo sabendo que às vezes tudo que precisamos é de um elogio bonito e um belo tapa na bunda. Afinal, é verão. La fora e aqui dentro também. Em fim.

sábado, 21 de novembro de 2009

Fica a dica!

"No dia que as mulheres descobrirem o que querem, esse mundo perderá a graça, hehe." [Gabriel Campos, Chiclete]
Toda mulher é burra. Mas pra não nos chamarem de burras, inventaram a palavra "românticas". Não é difícil conquistar uma mulher. O homem que consegue, às, sei lá, 16:53 - horário mais que quebrado e improvável - mandar uma mensagem sem motivo aparente, dizendo que ela é linda e que ele sente saudade, ganha o jogo de cara! Agora, resta saber por que 99,9% deles não conseguem...
Porque são burros, talvez. Ou seria melhor eu dizer "distraídos" ?

quinta-feira, 12 de novembro de 2009

Blackout

[No país e na minha cabeça também.]

domingo, 8 de novembro de 2009

Por hora, bastaria.


Ir embora em silêncio, sem dizer adeus e em passos lentos (quase flutuando). Largar casa, emprego e tudo que foi e não é mais. Dar o fora daqui, dessa cidade, dessas pessoas e ir viver de amor em uma cabana. Viver no estado mais bruto e primitivo de felicidade. Deitar numa rede e observar as estrelas e a lua cheia no céu, e contemplar a simplicidade da vida. Onde qualquer problema se resolva só de eu me encaixar embaixo dos seus braços.Acordar com a luz do sol. Acreditar em cristais, astrologia e no sexo dos anjos. E ter uma fonte perto do jardim. Um cachorro solto no quintal e passarinhos soltos pelo céu. Conhecer a vida crua. Repleta de paz. Tudo ridiculamente simples. Nomear as pintas do seu corpo pra me distrair. Ouvindo jazz e bossa nova. Viver só com o necessario, sem exageros e sem vicios. A vida seria besta. Mas por hora, bastaria.

sexta-feira, 6 de novembro de 2009

Entre karmas e amigos



Conheço o tamanho do poder das palavras. E como a Lo pediu. Resolvi parar 10 minutos antes de ficar bonitinha para sair e escrever um texto. Um texto feito pra acalmar o coração de uma amiga e aproveitar pra dizer a um amigo querido que fez aniversário por esses dias o quanto ele é importante na minha vida.

Difícil escrever assim por encomenda. Tentei alguns começos, apaguei, comecei mais algumas vezes e nada. Peguei um cigarro (ainda to tentando parar, mas também não da pra parar de vez né?!), andei até a janela e fui ver o movimento. A tentativa de largar o cigarro e os remédios pra dormir, que o médico me receitou, tem me feito viver menos entre cigarros e xícaras de café nas noites de insônia. Só me restou, então, buscar inspiração no mundo do lado de fora da minha janela. Olhei a rua como se fosse a primeira vez que a visse. Dei mais um trago e me senti inútil por não conseguir largar o vicio. Tentei imaginar o que escrever para acalmar o coração da amiga que está em casa derrubada por uma virose. E ainda no que escrever pro amigo que está km e km longe de mim, mas tão perto do coração que sinto como se um pedaço do coração dele batesse dentro de mim, juntinho ao meu.

Parada assim, na janela, olhando o mundo la fora, consigo ver o mundo aqui dentro de mim. Acho que ver as pessoas em movimento me da a sensação de que estão todos seguindo seus caminhos e que o mundo está bem. E se la fora ta tudo bem, é preciso, então, começar a arrumar o que está aqui dentro. Entender o momento. Entender o sentimento (ainda me mantenho nessa luta). Entender os porquês das coisas que tem porquês. E lembrar das coisas que não tem porquês só pra sentir o gostinho do inexplicável mais uma vez. Queria escrever pra acalmar o coração de uma amiga, pra dizer prum amigo como é gostosa a sensação de sentir sua presença mesmo ele estando anos luz de distancia. Mas de tanto olhar la pra fora buscando inspiração acabei vendo o que está aqui dentro. Aqui dentro está tudo confuso, está tudo uma bagunça. Porque parece que estou fadada a viver um tipo de Karma.

Digo isso pensando nos amores que tive. Todos com ares de “ter tudo pra dar certo”, e no final não dão. Todos eles. Uma sucessão de falta de sintonia. É sempre assim, eles chegam vêem de perto meu formigamento e minha pressa de vida. Se assustam com os buracos que minhas asas fazem em minhas blusas, mas acabam por aceitar o desafio. Pegam na minha mão e tentam me fazer diminuir o ritmo. Acontece que dou passos largos, e aos poucos eles precisam acelerar os passos se quiserem continuar ao meu lado sem soltar as mãos. E saem correndo comigo, e se acostumam com toda a inconstância que eu apresento. Só que chega uma hora que eu canso. Não deles, mas de amar a mil por hora. Não que eu não vá acelerar meu ritmo novamente, mas há momentos em que tudo que quero é me enroscar no colo de alguém e manter meus pés quentes durante a madrugada. Mas quando eu que fico cansada procurando um amorzinho calmo são eles que têm sede de tudo. E já não se contentam mais em ver meus momentos de tédio de perto. E saem por aí fazendo com que as pessoas se apaixonem perdidamente por eles, para depois se cansarem delas, e partirem então para uma nova história de amor fulminante que durará 60 minutos. Uma sucessão de falta de sintonia. Algo parecido com aquela história onde “primeiro ele a queria e ela nem dava bola, depois ela o quis e ele não quis mais. Ai quando ela desistiu, ele voltou a querê-la”. (Conhece essa historia?!).

E de repente surge um novo alguém, um novo sentimento, um novo contrair de dedos, e tudo aqui dentro fica confuso. E eu deveria escrever um texto que não falasse sobre meu próprio umbigo nem sobre uma espécie de maldição que me persegue. Mas meu coração já foi vasculhado e posto de cabeça pra baixo e por isso acho que não consigo. A janela está aqui escancarada na minha frente mostrando que as pessoas continuam indo, que o mundo continua indo, e que eu, que tenho formigamento e pressa de vida, não posso parar por medo de um karma maldito que me persegue. A janela ta escancarada e do lado de fora tem a Lo com quem eu falo sempre que preciso de suporte. Uma amizade nova, mas que parece existir desde 1930. Tem o Gui, que andou fazendo aniversário e que apesar de eu ficar anos e anos sem vê-lo, afirmo indubitavelmente que um pedaço do coração dele bate dentro de mim. Ele dá suporte a minha alma. Então que esteja uma desordem, que a casa esteja vasculhada, lá fora tem o mundo que segue bem e as pessoas que seguem seus caminhos.Tem minha amiga que apesar da virose continua atenciosa, carinhosa, emotiva, passional e assustadoramente parecida comigo e o amigo querido que é único no mundo, tem jeito de artista e ainda cede um pedaço dele pra morar dentro de mim.

Parada assim, na janela, olhando o mundo la fora, consigo ver, agora, que não se pode amar nada no mundo com a mesma intensidade que amamos as pessoas que nos fazem bem, e aí, o karma em que estou fadada a viver começa a parecer pequeno. E no fundo talvez o seja.

sábado, 31 de outubro de 2009

Cargo dificil de aguentar!

Não sou sutil, não é meu forte. A TPM chega e eu choro descaradamente na frente de quem for, e depois morro de vergonha. Ser mulher é cargo dificil de aguentar. E entre doces e mais doces, sempre uma dose extra de dramas e clichês. E é nessa época do mês que eu perco o poder sobre as palavras que escrevo. E tento botar pra fora aquilo que não consigo gritar. E fico louca e em seguida apática. Escrevo textos e paro no meio. Queria escrever pra falar sobre perguntas que ficam sem respostas e como é dificil conviver com elas. Mas a TPM me consome e não me deixa escrever o que quero, só o que sinto. Sinto tudo e não sinto nada. Sina de que tem o coração trancado. Estou trancada. Pra dentro e pra fora, ninguém entra mas ao mesmo tempo ninguém sai! Mas deveria sair. Talvez se me dessem as respostas das perguntas que ficaram no ar. Talvez se eu parasse de responder as perguntas que nunca me fizeram. Mas o que posso fazer?! Está tudo escrito na minha cara pra quem quiser ler. E ai eu começo a achar que eu não tenho talento pra coisa e ameaço parar de escrever. Depois lembro que chorei e sorri entre palavras e papéis. Só que hoje não controlo mais as palavras. Porque meu coração está trancado, niguém entra e ninguém sai. E eu não sou sutil, tenho tudo estampado na minha testa. Tenho estampado no meu corpo e debaixo das minhas dobras coisas que eu sei que você lê e ignora. E o dia ta cinzento e essa chuva aumenta minha vontade de esmagar o edredom, não pensar em nada e comer uma caixa de bis laka. A TPM vem e tira tudo do lugar, revira minha vida, minha calma, meu orgulho, meus textos e minha pose de mulher equilibrada. E entre doces e mais doces, uma dose extra de dramas e clichês. Ser mulher é cargo dificil de aguentar.

quinta-feira, 29 de outubro de 2009

Entre o céu e a terra.

* Se vc nunca ouviu falar em Jerê, provavelmente não vai entender nada deste texto! rsrsrs



Esfreguei os olhos pra enxergar melhor, mas só o que vi foi uma imensidão azul. Tão quieto e tranqüilo que parecia não existir som algum ali. Dei um passo pra frente, e estranhamente não senti o peso do meu corpo, não senti o ar em atrito à minha pele. Seria um imenso e azul espaço vácuo se eu não estivesse respirando tão bem. Meu corpo reagia bem àquela paz e àquela quietude tão incomum para mim. De repente me dei conta que estava sozinha ali. Olhei em volta, procurei por cima, por baixo e por todos os lados e nada. Senti meu coração acelerado pelo medo. Poderia suportar qualquer coisa, mas jamais a solidão!

- Não tenha medo de estar só. A solidão é a melhor forma de autoconhecimento.

A voz vinha de trás. Me virei e vi um homem de cabelos negros, começando a ficar grisalho, alto, nem tão moço, nem tão velho, mas tinha os olhos resplandecentes de sabedoria. Estava sentado em cima de uma mala feita de madeira, que já parecia ter alguns milênios de existência.

Mas quem é você? – perguntei.
E com uma voz que, apesar de doce, soava melancólica, me respondeu: - Sou eu, seu amigo, Jerê!

(Trilha sonora de efeito: I Said I didnt come here to leave you, i didnt come here to lose.. )

Lilla: - Eu pensei que você fosse mais velho!! – Quase precisei gritar pra poder ser ouvida por cima daquela música
Jerê: - Sou do (..I didn't come here believing I would ever be away from you..)
Lilla:
- Desculpe, não consegui te ouvir.
Jerê: - Ó perdão – e com um gesto fez a música parar- O efeito sonoro causa grandes emoções aos seres humanos, sabia?! – Disse meio envergonhado, tentando se explicar.
Lilla: - Tudo bem. Mas como eu disse, achei que fosse mais velho.
Jerê: - Sou do jeito que você me vê ai dentro do seu coração.
Lilla: - Então se eu fosse um bicho, um coelho por exemplo...
Jerê: (interrompendo) - Provavelmente eu teria a forma de um coelho, ou quem sabe de um grande cenourão! – E riu de si mesmo como se aquela tivesse sido a piada do século.
Lilla : - He He He... Mas, Jerê, por que a mala? – Mudei de assunto antes que ele tentasse uma nova piada.
Jerê: - Estou de partida por tempo indeterminado.
Lilla: - Mas porque? Conheço muita gente que te lê. Que busca sabedoria nas coisas que escreve.
Jerê: - Ando meio abatido, preciso me recolher à solidão. Lembra da lição que te dei agora a pouco?
Lilla: - Não prestei muita atenção, na verdade. Desculpe.
Jerê: - A solidão é a melhor forma de autoconhecimento.
Lilla: - Ah,sim. Lembrei. Jerê, você está abatido porque está apaixonado?
Jerê: - Não seja boba, não existe paixão entre os anjos.
Lilla: - Desculpa, é que só sei dar conselhos sobre isso.
Jerê: - Muitas forças atuam em você. Você só não sabe pra onde está indo.
Lilla: - Talvez porque eu não esteja indo a lugar nenhum. Ao contrario de você. - Falei olhando pro malão de madeira.
Jerê: - O movimento continua. Preciso ir.
Lilla: - Olha, Seu Jerê, não me leve a mal não, mas o senhor não pode ir embora assim, simplesmente do nada. Existem pessoas que precisam de direção, de ensinamento! A vida lá embaixo não é como aqui!
Jerê: - As coisas do espaço são mesmo misteriosas. Não tente entendê-las, saiba apenas que são amáveis.
Lilla: - É difícil sobreviver lá embaixo, sabia?!
Jerê: - Lá, muda-se as paisagens, as coisas de ver e de viver, mas você tem que permanecer a mesma. Porque você é eterna. Todos vocês são.
Lilla: - Já vi que não vou lhe convencer a ficar. Foi um prazer te conhecer, mas preciso voltar.
Jerê: - Não vá, fique aqui no meu lugar! Escreves tão bem.
Lilla: - Máeeeu???? Como poderia? Não sou anjo.
Jerê: - Não precisa ser anjo pra passar a frente sabedoria. Basta escrever com o coração.
Lilla: - Mas tudo que escrevo sai parecido comigo: inquieto, perdido e ansioso.
Jerê: - Encontre a paz que encontrará a resposta certa para escrever.
Lilla: - Não daria certo. Preciso do caos constante pra manter minhas turbinas funcionando.
Jerê: - Calma, respire um pouco e olhe em volta. Olhe em que lugar lindo estamos!!
Lilla: - Esse azul infinito me incomoda. Preciso voltar.
Jerê: - Você não sabe para onde está indo.
Lilla: - Estou indo pro lugar de onde não deveria ter saído. Têm pessoas esperando pra ler os meus textos e não vou deixá-los na mão. - E fui saindo,com o peito estufado, pensando: Botei moral no Jerê, quero ver se ele não volta!!!!!!

Esfreguei os olhos pra enxergar melhor, e vi que estava no meu quarto, na minha cama, acordando de um sonho. Estiquei um pouco as pernas, alongando-as. Olhei pro teto do meu quarto e corri pro computador com ânimo máximo pra escrever um novo texto. Quando liguei o monitor: (I Said I didnt come here to leave you, i didnt come here to lose.. ) e uma mensagem piscando na tela: "Nunca deixe de escrever. Leve a sério a vida e as coisas. AME. Reflita sobre isto. Do amigo do espaço.Jerê "

P.S: Texto especial pros orfãos de Jerê!!! hahahahahaha
P.S2: Desculpem minha falta de habilidade com discursos diretos.... hehehehehehe

quarta-feira, 28 de outubro de 2009

Sobre um sorriso, um global e dedos dos pés contraídos


Por trás de um blog sempre existe a eterna desculpa da ficção (e eu até que abuso bastante dela - da ficção). Mas hoje resolvi escrever abertamente sobre mim. E sobre uma amiga - que por não ter me dado permissão pra falar sobre ela, será protegida pelo anonimato. Isto porque não saberia descrever o que aconteceu por via de algum personagem. E também não queria criar ou rebuscar nenhum detalhe. Portanto só poderia ser eu mesma a personagem principal dessa história. Eu e minha amiga protegida pelo anonimato.

Tentei ficar o mais bonita possível – apesar de ter me recusado a trocar os óculos pelas lentes de contato - e dei o melhor de mim para um dia de domingo. Domingo a noite não costuma ser o momento ideal parar sair, mas la fomos nós pra rua. Buscar um pouco de samba e diversão. Mesmo a cabeça tendo andado pensando muito na imaturidade desajeitada de um músico que cruzou a minha vida, o coração anda admirando - entre umas festas e outras - o sorriso de um novo rapaz. Isto, porque quando ele sorri, meu corpo responde de forma estranha. Pura atração, eu sei, mas foi a busca por esse sorriso, somado à companhia imprescindível das amigas, que me deixou ansiosa pra entrar de uma vez naquela festa.

Lá dentro estava um formigueiro de gente se espremendo e tentando à cotoveladas abrir algum espaço para sambar ao som da bateria da Jucutuquara. Eu, que não sei sambar, fui caminhando colada na minha amiga, aceitando - apesar da dor - as pisadas no dedinho do pé e os esbarrões na boca do estômago. Em pouco mais de 15 minutos todo o esforço que eu tinha feito para ficar o mais bonita possível para uma noite de domingo tinha ido por água abaixo. O suor fazia meu cabelo colar no pescoço e a maquiagem escorrer por de trás dos aros dos meus óculos. O que não acabou com o meu ânimo, mas me deixou com medo de encontrar perdido por la o dono do sorriso que eu tinha ido procurar. “Vamos fumar um cigarro?” – convidei minha amiga, que nesta altura já estava de pés no chão, cabelo preso em coque no alto da cabeça e pedindo que a passista da escola de samba a ensinasse alguns passos. - “E olha que não bebi nem uma gota de álcool pra não sabotar a dieta” – Dizia ela pra mim, aceitando o convite pra fumar um cigarro.

Pelo menos nisso essa nova lei antitabagismo estava ajudando, afinal, pra fumar agora tem que ir pro lado de fora da boate. E seria este o momento que eu teria pra tentar recuperar o fôlego e voltar a procurar o menino de sorriso largo que faz meu rosto corar e meu dedão do pé se contrair dentro do sapato toda vez que o vejo. Estava distraída, fumando um cigarro com gosto de culpa (porque estou tentando parar), penteando os cabelos com os dedos e imaginando que talvez fosse melhor desistir. Ele tem o sorriso bonito, mas vive num mundo onde legal mesmo é essa coisa de não se apegar a ninguém e ser de todo mundo ao mesmo tempo. De repente, num grito, minha amiga chamou minha atenção “Joga o cigarro fora, se arruma e vamos entrar. Olha quem está ali?” – Vinha entrando um desses atores Globais que por onde passa causa um reboliço entre as mulheres e um burburinho entre os homens.

O Global entrou, e nós entramos atrás. Engraçado observar como as mulheres mudavam a postura e balançavam exageradamente os cabelos quando ele passava por perto. Pareciam concorrentes de um concurso estilo “Garota samba no pé 2009” e ele – o Global – seria o jurado que determinaria a ganhadora. Mas por sorte de minha amiga, e minha também (não vou negar que também quis dar uma olhadinha no global), ele parou no camarote bem perto ao nosso. A música estava boa, a companhia inigualável e a noite divertida. Minha amiga exalava alegria pelos poros, além do cheiro gostoso de perfume doce. E pude perceber pelo jeito que ela olhava pra ele, que naquele momento o dedão do pé dela também se contraía dentro do sapato. Foi quando de relance, quase que por uma coincidencia do destino, vi passando la longe o sorriso que eu procurava. Extremante galanteador. Talvez não aos olhos de qualquer pessoa, mas aos meus, um galanteador que parece saber jogar bem as cartas que tem na manga. E ficamos as duas ali ficcionadas, paradas no primeiro degrau da escada de Platão (que deveria estar se revirando no caixão uma hora dessa) atiçadas pela fantasia de querer se relacionar com alguém que tenha esse "quê" de impossível, de fora do alcance. Não porque andamos por ai catando o papel do chiclete que eles jogaram no chão. Mas porque é estimulante.

No fim, minha amiga conseguiu. Uma olhada e um sinal. O que pra ela bastou, afinal, ela exala um cheiro doce, samba de pé no chão e não participa de nenhum concurso estilo "Garota samba no pé 2009". Portanto ele que se virasse. E eu? Até tentei. Procurei pelo salão quem eu queria encontrar, mas o esforço foi em vão. Primeiro pensei em processar Murphy e os Deuses por danos morais. Depois achei que estava louca, mas lembrei que eu sempre fui assim e que as coisas são porque têm que ser. Pensei até em esquecer de vez essa historia. Pura atração, eu sei. Mas acontece, que quando ele passa na minha frente e sorri, meu corpo responde de forma estranha. Meu rosto fica corado e meus dedos se contraem no fundo do sapato...
Antes eu tivesse escolhido o global.

terça-feira, 27 de outubro de 2009

Quem conta um conto.. [Parte IV]

... Ana bebe displicente uma xícara de café, olhando a janela imaginando: “onde é que aquele sem vergonha está agora?” Provavelmente em cima do seu edredom branco falando com seu novo e calmo amor das loucuras do último que teve. Depois do fim. Depois que tudo acaba o que resta é a saudade. E só uma coisa é maior do que a saudade, o orgulho. E Ana é só coração – admite. Mas em momentos como esse a cabeça toma conta. O que não tem nada a ver com racionalidade. É a cabeça que pensa em dez desculpas fajutas para ligar e ouvir a voz dele de novo. E fica esperando notícias, e essa volta que nunca chega. E pensa na nova vida dele, no novo país, nos novos amigos e a faz imaginar como deve estar soando seus novos sons, e como deve estar sendo escritas suas novas músicas. E a faz morrer de ciúmes de todo mundo que pode vê-lo todos os dias enquanto ela lhe escreve cartas que jamais serão enviadas. É tudo culpa da cabeça, porque a distancia é imensa e o coração pequeno demais para ela. O coração, alias, conseguiu voltar a bater, mas a cabeça ainda sente falta e pensa muito nele. Coisa de gente apegada demais. Ou talvez viciada demais. Daquelas que sabem que não da certo, mas continuam apostando. No final, Ana deixa de lado, esquece, entende e não liga. Esquece a cabeça e volta a dar prioridade ao coração, que está voltando a bater feliz e só quer o carregar no bolso feito um daqueles chicletes que perdem o gosto...

quinta-feira, 22 de outubro de 2009

SAUDADES...

[05:15]

Hoje senti uma saudade absurda de você.
no meu som, a voz era a sua. Repetidamente.

Água com gás é o cacete, o negócio é sério!!
(dá o sinal)
- Whisky com energetico, por favor!

Odeio whisky!!
Mas como dizer que sinto saudades???
Merda de orgulho!

- Mais uma dose, por favor!

segunda-feira, 12 de outubro de 2009

“A sabedoria é algo que quando nos bate à porta já não nos serve para nada" [Gabriel Garcia Marquez]

Quando a gente entende que nascemos sós, morremos sós e gozamos sós, a vida começa a ficar mais fácil....

quarta-feira, 7 de outubro de 2009

Sobre as folhas das árvores e eu.

21:40, o chinelo jogado no fundo da sala. Eu, pés descalços, frente à janela, observando a cidade que se move lá em baixo, pensando em como está a vida e tentando me convencer de que o trabalho está bom. A noite tá quente e sem vento. Tudo se move, as folhas das árvores não. Enquanto isso, os carros vão passando e as pessoas no bar ao lado conversam e se movimentam num caos onde tudo parece em harmonia. Na cidade, esta noite, tudo se move menos as folhas das árvores e eu. Aqui dentro, eu vejo o maço, o livro, o chinelo longe e o ventilador que gira devagar, despreza meu calor e me joga um bafo ironicamente quente. Lá fora a cidade em que nasci e onde me sinto estrangeira.




22:17, O calor continua forte, eu continuo não sabendo se o trabalho tá bom e o chinelo continua longe. Pela janela vejo o bar lotado e alguns carros que passam. Bem que um deles podia me levar. Me levar para longe desse calor infernal e desse tédio que me consome. Reviro o maço. Vazio. Deslizo a mão pelo parapeito da janela, fecho os olhos por um instante e tento sentir a cidade. Tento me sentir na cidade. Mas pareço ser parte de um mundo paralelo a ela. Eu e as folhas das arvores que não se mexem. Elas lá em baixo, insensíveis e estáticas frente o caos urbano, ignorando seu meio e contrariando todo o resto que se move. E eu aqui, com meus pés descalços, olhando as pessoas lá fora, pensando que um daqueles carros bem que podia me levar daqui. Me fazer jogar o chinelo no lixo, o tédio para longe e me levar para algum lugar onde eu me sinta em casa, mesmo sendo estrangeira.

sexta-feira, 2 de outubro de 2009

Rotina

2 horas da manhã. É fácil olhar pra mim e falar que eu sou desequilibrada, mas é ele que só funciona no estopim, quando alguém grita no ouvido dele. Senão ele ficaria o dia inteiro com aquele ar de despreocupado de quem deixa tudo pra depois! Eu só queria o mínimo. Gosto das coisas pequenas. Das pequenas demonstrações de afeto. Gestos mínimos de carinho. Só queria que ele reparasse em minhas roupas, lesse o meu blog ou ligasse no meio da tarde pra perguntar como estava indo meu dia. Essas coisas, simples e que não custam dinheiro. Mas não adianta. Nem quando eu coloco meus vestidos primaveris cheios de cores, quando dou uma caprichada na maquiagem, ou quando uso uma roupa mais decotada pra ver se chama a atenção dele, ele repara em mim. Não me elogia. Ao invés disso, ele chega e reclama que eu estou fedendo a cigarro, ou que estou falando demais. Eu faço tanto por ele. Sempre odiei dormir acompanhada, com gente roubando meu espaço na cama e meus lençóis. E ele mexe a noite inteira. Atrapalha meu sono. Mas nunca falei, nunca reclamei com ele pra que ele não se sentisse mal ou culpado. Eu gosto de futebol e me esforço pra entender tudo sobre o time dele só pra poder conversar sobre coisas que ele gosta. Sou extrovertida e desencanada. Faço amizade fácil. Os amigos dele me adoram. E ele percebe? Não! E agora, quando eu resolvo falar que isso me incomoda, dá nisso: briga. E ainda joga na minha cara que eu brigo por coisa pequena. SIM, por coisa pequena! Estou brigando porque quero as coisas pequenas! Ele liga pelo menos 3 vezes por dia pra mãe dele, porque não pode me ligar pelo menos 1 vez e saber como está indo meu dia ou as coisas no trabalho? E agora ele ta lá dormindo no outro quarto só pra me torturar, só pra jogar na minha cara o nada que restou pra mim. Ele não merece meu jeito, meu gosto, meu tato, meu amor, minha falação desesperada, meu espernear pela casa, meus bicos e nem meus passos barulhentos pelo chão. Amanhã eu vou embora. Vou passar uns dias na casa da minha mãe. Vou fazer ele sentir falta. Vou fazer ele me ver indo embora, de óculos escuros e andando na contramão. Vou me afastar pra ver se assim ele sente falta do meu salto batendo no chão da sala, da minha falação e das minhas manias. Melhor dormir porque a cama estática está me incomodando e amanhã será um longo dia.

4 e meia da manhã. Ela tem esse jeito de só funcionar em alta velocidade e reclama constantemente que precisa de um pequeno caos interno pra poder conseguir escrever. E escreve compulsivamente. Escreve no blog e tenta escrever um livro. Eu a encorajo sobre o livro embora nunca leia o blog dela. Tenho medo do que ela escreve lá. Reclama que não dou a ela o suficiente. Mas eu não digo que ela não precisa daqueles vestidos floridos cheio de cores pra chamar atenção, pra que ela não ache que estou falando mal das roupas dela. Não reclamo quando ela exagera na maquiagem. E nem quando abusa daqueles decotes. O que me deixa louco de ciúmes e raiva, mas não falo. Me esforço pra tentar convencê-la a parar de fumar porque me preocupo com a saúde dela. Na hora de dormir, reclama do mau tempo e do ar condicionado e pede pra desligar o ar e abrir a janela, eu deixo. Depois reclama do barulho do trânsito e fecha a janela. Transforma o quarto numa estufa. E o calor insuportável atrapalha meu sono, me faz rolar por horas na cama até conseguir dormir. Não falo que é estranho ouvi-la falar sobre futebol e nem rio das besteiras que ela fala quando é este o assunto. Aceito seu jeito expansivo e a forma como fala alto e gesticula e me faz sentir invisível quando estou com meus amigos, porque ela fala demais e arranca gargalhadas deles, sem deixar espaço para mais ninguém. E ela diz que não faço o suficiente! Diz que gosta das coisas pequenas. Mas eu não consigo entender o que essa mulher pode querer mais. Tá ai, agora, dormindo. E eu aqui parado na porta do quarto. Tentei ir embora. Porque ela não merece que eu atrapalhe sua vida e suas coisas e nem minha quietude voluntária, nem meu jeito próprio de respeitar seu barulhento andar pela casa. Mas a porta estava aberta e do corredor pude vê-la dormindo, com a franja jogada no rosto e essa calma absurda que só aparece quando ela dorme. Não consigo parar de olhá-la. E é nesse momento de paz onde eu posso ficar em silêncio que ela fica mais bonita. Ela diz que ama as coisas simples da vida. Porra nenhuma! Está sempre querendo um pouco mais, sempre falta alguma coisa. A verdade é que quem gosta das pequenas coisas sou eu, que só quero ficar aqui olhando para ela dormindo e imaginando o que dizer amanhã quando ela vier com alguma historia maluca dizendo que está indo embora pra outro país ou voltando pra casa da mãe.

quarta-feira, 23 de setembro de 2009

Vitrines


Confesso não ter me animado muito pra levantar da cama quando abri um único olho, poupando o outro da claridade, e vi que a meteorologia não estava querendo cooperar comigo e tinha mandado mais um dia nublado e quente – daqueles que faz chover a noite. Mas maior do que a vontade de ficar deitada era o calor que estava fazendo. Eu suava tanto que voltar a dormir seria uma tarefa impossível. O cabelo colado na nuca suada, a boca com gosto de travesseiro e a franja em pé, arrepiada como a de um pica-pau. Ao lado da cama, o cinzeiro vazio. Essa nova onda antitabagismo tem me motivado a largar o cigarro. Levantei. E quase uma hora e meia se passaram quando eu, finalmente, terminei a maratona acordar - tomar banho - por uma roupa - tomar um cappuccino – sair de casa – me arrastar até o ponto de ônibus.

Foi difícil, mas pra dar uma ajuda o ônibus passou no segundo seguinte que cheguei no ponto. Entrei agradecendo a alguma força divina pela sorte, e fui me sentar no canto da janela desses bancos mais altos que tem em ônibus. Me distraí olhando as pessoas que passavam pela rua – como quem olha vitrines sem olhar vitrines - e acompanhei o trajeto já conhecido. Só voltei a prestar atenção ao que acontecia no interior do ônibus quando uma pessoa sentou do meu lado. Um rapaz estranhamente belo, ou, belamente estranho. Não soube dizer qual era a ordem correta. Só sei que alguma coisa nele me atraiu a ponto de me deixar desconcertada, sem saber onde pôr as mãos ou para onde olhar.

Ele usava uma camiseta com o escrito: “Engenharia Civil”, um all star branco tão surrado quanto o meu, um boné escondendo o cabelo bagunçado, mochila nas costas e um maço de cigarros na mão. Deve ter uma namorada fofa e peituda que estuda odonto. O suficiente para se tornar o mais novo homem da minha vida. Olhei pra mim mesma condenando meu desleixo matinal e preferi virar o rosto e continuar olhando as pessoas do lado de fora. Olhando vitrines sem olhar vitrines. De repente me vi de mãos dadas a ele. E imaginei como a vida seria. A gente combinaria e formaria um casal feliz e minhas roupas teriam uma gaveta só pra elas no armário dele e ele perderia horas conversando sobre engenharia com meu avô enquanto eu ensinaria a irmã caçula dele a falar inglês. E ele daria risada da minha falação desesperada e a cama ficaria mais quente e ele roubaria meu edredom e eu o acordaria de noite reclamando da insônia ou dos chutes noturnos dele e pediria que perdesse o sono junto comigo. E ele deu o sinal, levantou e saltou do ônibus, enquanto eu permanecia ali tensa, invisível e apaixonada. Ele se foi e nem notou que acabava ali a nossa linda história de amor.

Depois de quase perder o ponto em que eu deveria descer, cheguei na faculdade pedindo colo pras amiga e dizendo que estava me recuperando de um relacionamento intenso. Desisti da idéia de assistir a primeira aula. Sentei na cantina e fiquei ali, parada, me recuperando. Foi quando me deparei com um sujeito de jeans, camisa xadrez amarrotada (aposto que ele tinha acabado de acordar) e havaianas nos pés. E comecei a olhar pro nada, com olhar de quem vê vitrines sem ver vitrines...

quarta-feira, 16 de setembro de 2009

Morto-vivo, Vivo-morto.

4:41 a.m

Insônia

(ponto final)

sábado, 12 de setembro de 2009

Semelhança.

"Alice - Mas eu não quero me encontrar com gente louca.
Gato - Você não pode evitar isso, todos nós aqui somos loucos, eu sou louco, você é louca.
Alice - Como sabe que eu sou louca?
Gato - Deve ser, ou não teria vindo parar aqui."
[Lewis Carroll - Alice no país das maravilhas]

* Grandes personagens têm diálogos fantásticos. Pessoas reais têm Diálogos Imagináveis. Fica a dica de blog ;)

terça-feira, 1 de setembro de 2009

E meu lençol não tinha mais seu cheiro mas meu armário ainda tinha suas roupas...

Despertara? Não sabia ainda. Sentia muito frio, isso sim. Pisquei o olho e encarei por alguns minutos o teto do meu quarto. Estava realmente frio e só por isso resolvi levantar. Meio cambaleando caminhei até o armário e sem prestar muita atenção, puxei uma blusa de manga qualquer de dentro da gaveta. E foi só depois de vesti-la que percebi que não era uma blusa minha. Era blusa de homem. Dei de ombros. Talvez fosse uma das inúmeras peças de roupa do meu pai que veio na mala quando vim morar com minha mãe. Enquanto eu me esticava espreguiçando, vi pela janela que fazia manhã de sol apesar do vento frio. Graças a Deus não vai chover.

Foi quando eu já estava na cozinha preparando uma xícara de café, que minha mãe entrou e perguntou que roupa era aquela que eu estava usando. Ela já estava acostumada a me ver andando pela casa de cueca e samba-canção, ou qualquer outra peça de roupa dos meus ex-meninos (e isso inclui meu pai), mas mesmo assim sempre perguntava por que eu insisto em usá-las e em guardá-las como bibelôs do meu passado. Enquanto me fazia essas perguntas, veio em minha mente o nome do dono da, agora minha, blusa. Fiquei atordoada com a repentina lembrança, mas disfarcei. Respondi que pra mim eram pedaços de pano e mais nada. E que essa história de “bibelôs” não tinha o menor fundamento. MENTIRA. De fato algumas dessas peças são, realmente, só pedaços de pano confortáveis e bons para usar dentro de casa. Mas aquela camisa em especial tinha tempo que eu não via. Ficou guardada no fundo da gaveta tão esquecida quanto o verdadeiro dono dela.

Sem que minha mãe visse, cheirei a manga pra ver se encontrava, impregnado nela, o cheiro de algum perfume. Tinha cheiro de roupa guardada. E nada mais. Claro que depois de tantos anos - quase 4 anos pra ser mais especifica - esquecida no fundo do meu armário, ela só poderia estar cheirando a velho. E foi ali, na cozinha da minha casa, vestida com a camisa com cheiro de velho, que eu parei por alguns segundos pra contemplar o passado. Lembrei do namoro que, enquanto durou, cumpriu seu papel. E isso, agora, já não tinha mais a menor importância. Pensei na minha devoção e no amor imaturo e desmedido. E senti saudades. Não só dele, mas de quem eu era naquela época. E pensei no que aquela menina diria se me visse hoje. De certo me olharia bem no fundo dos olhos e diria, com a voz mais imponente que conseguisse produzir, que de nada adianta a vida se não amarmos ninguém, menos ainda se não amarmos para sempre. E eu a pegaria pelas mãos e – mesmo sabendo que ela não entenderia, optaria em alertá-la. Responderia que de nada adianta a vida se não soubermos seguir em frente, ainda que com o coração partido.

Minha mãe continuava na cozinha, agora falando sobre uma dieta nova que estava pensando em fazer. Balancei a cabeça e sorri, deixando-a que achasse que era um sorriso em resposta àquela conversa – que na verdade eu não tinha prestado muita atenção. Mas eu sabia que eu tinha sorrido um sorriso diferente. Não desses que se da a alguém, e sim desses que se dá pra você mesmo. Sorri pra dentro. E me senti feliz. Demorei tanto pra expurgar de dentro de mim esse passado, e agora o próprio passado ressurge vários anos luz depois, pra me mostrar que entre trancos e barrancos ele valeu a pena. Acordei sentindo frio. E puxei uma blusa de manga qualquer de dentro da gaveta. Uma blusa com cheiro de velho que ressurgiu não só pra me fazer sorrir pra dentro. Mas também pra me mostrar, em alguns segundos em que parei pra contemplar o passado, que o melhor da vida é o tempo!

terça-feira, 25 de agosto de 2009

(in)dependência


Chego para dar minha aula carregando o peso das minhas responsabilidades. O dinheiro que acabou antes de acabarem as contas. O carro que está quebrado e por isso tenho que esperar por horas no ponto de ônibus. A menina de cabelo ruivo, sempre preso em maria-chiquinha, que anda me dando trabalho. E a falta de motivação que me assolou nesta terça-feira fria.

Chego, e ao cruzar o portão, o porteiro me grita. Professora Lívia. Não ouvi e continuei andando. Ele repetiu agora mais alto. Professora Lívia! Olhei pra trás com a sensação de “ficha caindo”. Acho que tinha escutado da primeira vez, mas meu cérebro não armazenou a informação, não percebeu que era comigo. Isso porque foi a primeira vez que ouvi alguém – fora de sala de aula - me chamando de professora. E o fato de ter acontecido nos pátios da escola em que eu tinha sido aluna por tanto tempo, mexeu profundamente com minha emoção (e com meu ego). Recebi o recado e fui andando em direção à sala onde eu daria aula.

Com o arquivo da memória prontamente acessado, lembrei da época em que estudei ali. Dos professores que elogiavam largamente minha inteligência e ao mesmo tempo a condenavam em função da minha preguiça. Lembrei de como era um sacrifício para eu acordar às 7 da manhã na época do segundo grau, e de como o vestibular me assustava. Mas tudo isso tinha passado, e agora voltava ali ocupando o cargo de professora. Professora Lívia.

Apesar do orgulho inflando meu peito, confessei - para mim mesma - ter outros planos pra minha vida. Ser professor no Brasil é uma tarefa para poucos. E a baixa remuneração é o menor dos nossos problemas. Mas apesar de ter outros planos, do peso das responsabilidades, do dinheiro que anda faltando e do carro quebrado, ainda existe a menina de cabelo ruivo, sempre preso. A menina tem me dado trabalho. Mas a menina é daquelas molecas, que cai, chora muito e se levanta balançando as marias-chiquinhas e mostrando o quanto é forte. Fazendo brotar em mim, em uma terça-feira fria, um apreço imenso.

segunda-feira, 17 de agosto de 2009

A voar, a voar, a voar!

"Ela lhe contou histórias, ele a ensinou a voar..."


Me lembro de ter me apaixonado loucamente, quando criança, pelo Peter Pan. O do desenho animado mesmo. Com aquele nariz torto e ar tinhoso! Adorava o fato dele não querer crescer, o que – na minha cabeça de criança - significava dizer que ele teria pra sempre a minha idade. Sim, eu achava que seria eternamente criança. Peter Pan era valente e engraçado. E conseguia voar. Mas era daquele nariz torto e daquele jeito tinhoso que eu gostava! Eu ficava ali, vidrada na televisão, me imaginando no lugar da Wendy, vivendo um romance com Peter, querendo, mais do que ter uma babá como a cachorra Naná, dar uma bica na Sininho e morrendo de medo do Capitão Gancho – que naquela época era um personagem malvado e não um antecedente mal feito do Jack Sparrow.

O tempo passou e outros narizes tortos e ares tinhosos foram aparecendo na minha vida. Alguns deles até me fizeram achar que podia voar. Mas, como que por uma maldição lançada por um Peter Pan ciumento que ficara esquecido no meu passado – eles também não queriam crescer. À medida que eu ia crescendo (não só no tamanho) os meus Peters insistiam em se manter infantis e rodeados de garotos perdidos. Isso quando não resolviam viajar até a ‘segunda estrela à direita, direto até o amanhecer’ ou sabe-se lá pra que parte do mundo. E exatamente como a Wendy, que no filme opta em deixar seu amor pra crescer, eu tive que os deixar para que eu pudesse crescer.

Alguns anos mais tarde, assisti novamente ao desenho. E, sem a inocência que eu tinha quando criança, descobri que Peter queria mesmo era que a Wendy pudesse fazer o papel de mãe e contasse histórias para ele e os garotos perdidos. E que seu grande amor na verdade era a Filha duma p*** da Sininho. Não preciso dizer que a vontade de dar uma bica na fadinha, que eu tinha quando criança, triplicou depois disso! Era o fim. Declarei morto e enterrado o meu romance secreto com Peter Pan. Ele que ficasse lá pela Terra do Nunca e me deixasse em paz!

E assim ficou até ontem, quando o menino maroto de nariz torto reapareceu na minha televisão. Desta vez, na continuação do filme – Peter Pan, de volta à Terra do Nunca – que eu nunca tinha visto. Eu sabia que existia uma versão hollywoodiana do filme, mas nunca tive muito interesse em assistir. Agora, que existia uma continuação em desenho, com aquele mesmo Peter de desenho animado antigo e com a roupa com uma nuance só de verde, exatamente como o da minha infância, eu não sabia! Confesso que meu coração bateu entusiasmado quando reencontrei, sem que eu esperasse, Peter Pan. O mesmo entusiasmo que a gente sente quando reencontra um amor do passado e fica curioso pra saber pra onde a vida o levou.

Assisti colada na televisão, da mesma forma que fazia quando criança. O filme tem uma mensagem bonita. Trata da importância de mantermos viva a nossa imaginação. Bacana, mas eu estava mesmo era esperando que acontecesse o reencontro entre Wendy e Peter. E ele aconteceu. Nem podia acreditar no que estava vendo. Uma Wendy adulta, mãe de família, reencontrando o menino que se negara a crescer. Claro que foi só um encontro casual. Um olhar daqui e um sorrisinho dali. Nada mais. Peter reapareceu de surpresa pra Wendy, assim como reapareceu, ontem, para mim. E da mesma forma que veio, voltou para a Terra do Nunca - com a (eterna) Sininho do lado. Deixando Wendy e eu para trás, na janela, suspirando. Nunca cresça e apareça quando eu menos esperar, Peter Pan...

P.S: a TPM e a irritação passaram, mas continuo tomando porres de nostalgia todos os dias. Ah! E também continuo monotemática, mas não dou mais a mínima pra isso.

terça-feira, 11 de agosto de 2009

Medo

Porque o monólogo não é mais assustador do que o saber que se é lido...

terça-feira, 4 de agosto de 2009

".. porque também na minha casa, hoje, nenhuma cadeira continua como estava ontem, pois eu já não sou o mesmo." [Dostoievski - Noites Brancas]

Ainda to de TPM, ainda to ansiosa, ainda to agitada e agora além de tudo to irritada por me sentir monotemática! Não consigo pensar em escrever sobre outra coisa que não seja amor, dor de cotovelo, café, insônia e cigarros. Vejo os primeiros posts que escrevi aqui e adoro! Por que não consigo mais escrever daquela forma? E também nem sei se alguém além da minha mãe lê isso aqui, na verdade, nem sei se minha mãe lê! Um blog sem comentários ou monotemático é um monólogo e eu dificilmente me interesso por eles. Não to interessada nele! Não por agora. Agora eu só to interessada em amor, dor de cotovelo, café, insônia e cigarros...

sábado, 1 de agosto de 2009

Por que não me avisou antes, Aristóteles?!

Ontem fez noite de chuva. Odeio chuva. E como de costume, estava sem sono. Ando me sentindo muito sentimental. O que é perigoso. Mulher fica burra quando está sentimental. E pra completar acabei de entrar na TPM. Mais burra do que mulher sentimental em época de TPM, impossível! E já que mais uma vez eu iria fazer companhia às longas horas da madrugada, fui procurar algo pra ler. Eu estava tão agitada, tão ansiosa, e tão sem motivo pra isso que decidi que naquela noite de insônia não sentiria nem cheiro de café. Precisava era ler algo menos existencial, menos romântico, menos poético, menos maldito, menos boêmio, menos Caio Fernando Abreu, menos Bukowski, menos Gabriel Garcia Marquez, menos Nietzsche, menos Álvaro de Campos (F. Pessoa), menos Dostoievski e principalmente menos Vinicius. Reneguei todos os meus grandes ídolos. Precisava de algo que fortalecesse meu racional e não meu emocional. E por isso, só por isso, resolvi ler um pouco de Aristóteles. Há quem diga que todo intelectual que se preze já leu Aristóteles, Platão e companhia ateniense, grega e macedônia limitada. Não sou intelectual. Nunca li nenhum deles - Confesso. Nunca tive muita paciência, na verdade. São filósofos, cientistas, físicos, teólogos, professores, pintores, escritores e sabe-se lá mais o quê, tudo ao mesmo tempo. Informação demais pra mim. Na minha cabeça (e dentro da minha ignorancia no assunto) tudo se resume na tentativa de provar que a salvação do mundo está na razão. Ontem, eu, que não uso a razão pra nada, resolvi encarar. E com o nariz meio torto comecei a dar meus primeiros passos rumo ao momento mais intelectual da minha vida. Li sobre a relação entre Aristóteles e Platão, sobre a moral, a teologia, política, psicologia e mais um monte de coisa que eu só passei o olho. E acabei encontrando algo que realmente me inspirou. Despertando todo o sentimentalismo que eu tinha deixado de lado naquela noite. Aristóteles disse: "o ideal do amor é a amizade em excesso". Meu coração até bateu mais rápido. Fiquei alguns minutos digerindo essa informação, e teria ficado mais alguns se os malditos pingos de chuva batendo na janela não tivessem me distraído (queria saber quem foi o asno que disse que barulho de chuva ajuda a dormir). Quis continuar lendo, na expectativa de encontrar nas palavras de um filósofo que a salvação do mundo era o amor e não a porcaria da razão. E depois de algumas horas nessa medida de um pra um - um parágrafo chato pra um parágrafo sensacional – descobri que no fim da vida Aristóteles, como um belo de um vira-casaca, disse: "amigos, não há amigos"! Meu estomago revirou, minha cabeça pesou, a ansiedade ressurgiu como um furacão e a maldita TPM me fez sentir vontade de chorar. Desliguei o computador e fui deitar. Sentimental, burra e de TPM. Por que não me avisou antes, Aristóteles?!

quinta-feira, 30 de julho de 2009

Quem conta um conto.. [Parte III]

"... Isto de sensações só vale a pena se a gente se não põe a olhar para elas." [Álvaro de Campos]

* Foto retirada de http://samacc.wordpress.com/
... 1 semana. Havia se passado exatamente uma semana desde o dia em que Ana perdera o vôo, e a mala ainda estava feita, jogada no canto do quarto. Apesar de não assumir pra si mesma - como se isso fosse possível - ela sabia que lá no fundo tinha a esperança de ainda embarcar. De pegar um novo vôo e partir. Partir atrás de suas idealizações. Mas naquela manhã, resolveu desfazer as malas e todos os seus planos junto com ela. Agora seria assim: Nada de planos. Ana estava decidida. Não queria mais idealizar, programar e nem sonhar nada. Até porque, andava sonhando em preto e branco, e não precisa ser gênio pra entender que sonhar em preto e branco é sinal de problema.

Fazia uma manhã irritantemente bela, o céu estava turquesa e sem nuvens. “Pelo menos não vai chover.” E ela agora precisava se contentar de que a vida nem sempre é feita de momentos bons. Que não adianta buscar felicidade eterna. Às vezes tem que se descer ladeira abaixo, pra só então subir novamente, com mais força, mais garra e com mais vontade de ser feliz. E Billie Holiday, agora, serviria para lhe lembrar que o tempo coloca data de validade nas coisas. Um dia, tudo apodrece.

E assim, regada de filosofias baratas, Ana desfez a mala, arrumou o armário e a mente também. Desceu as escadas e foi fazer algo que não fazia já há muito tempo, andar. Andar pelo bairro e observar a vizinhança. Não que ela tivesse algum interesse naquelas pessoas. Mas a sensação de recomeço, de mudança e de vontade de ser a pessoa mais bem resolvida - que a gente sente depois de se recuperar de uma decepção – tinha esvaziado sua mente. Ana tinha se acostumado a viver em meio a café e cigarros. Não sabia muito bem como agir agora que tinha resolvido ser uma pessoa com menos problemas - problemas reais pelo menos. Pessoas felizes e bem resolvidas andam pela rua observando a vizinhança e sorrindo pra todo mundo. E foi só pra cumprir o protocolo que ela foi fazer o mesmo.

Voltou pra casa cansada e suada, mas com a sensação de dever cumprido. Tinha sorrido pra mais gente na rua do que ela havia sorrido durante o último ano inteiro. Tomou um banho rápido - pra não ter tempo de se perder em devaneios em baixo do chuveiro – ligou o som na rádio. Filosofia barata combina com música barata. Acendeu um cigarro. “Afinal, pessoas bem resolvidas também têm seus vícios”. Sentou no sofá, esticou as pernas e ficou ali, com cara de quem espera sem medo o que o tempo fará com ela. Mesmo sabendo que no final, ele a faria perder a validade. Um dia, tudo apodrece..

[Não sei se continua.. rsrs]

segunda-feira, 27 de julho de 2009

Quem conta um conto.. [Parte II]

"Natural é as pessoas se encontrarem e se perderem". [Caio Fernando Abreu]



... Fez as malas e saiu. Entrou num taxi e lá foi ela, embaixo ao sol preguiçoso de inverno, em busca de alguns dias repletos de prazer. Depois de uma noite inteira sem dormir, brigando com o relógio, Ana finalmente tinha percebido que o que queria era momentos bons. Que doesse depois - não se importava. Mas passariam milênios e ela ainda teria lembranças daquela viagem. O coração batia forte agora e a boca cada vez mais seca. Culpa de ter bebido tanto café de madrugada. Pensou por um instante se aquilo lhe faria mal durante o vôo, mas logo esqueceu. Conferiu os documentos, as passagens, a bagagem de mão. “OB, batom, perfume. Ok! Está tudo aqui.” Nesta altura tinha até esquecido do relógio, e resolveu conferir as horas. 10h35(!!). 10 e 35! Não podia ser tão tarde! O avião partiria nos próximos 10 minutos e ela não podia ficar pra trás!

Arregaçou as portas do aeroporto deixando cair amor por onde passava e desejando que por algum milagre conseguisse pegar aquele vôo. Chegou a cabine da companhia aérea apenas pra constatar o que no fundo ela já sabia: havia perdido o vôo. Fez tudo que pode. pediu que embarcasse com as malas no colo. "Prometo não incomodar ninguém!" Tentou trocar a hora da passagem, mas não havia nada que pudesse fazer. Já que estava ali, subiu os degraus e foi pra janela ver o avião decolar. E lá se foi todo o seu êxtase, toda a sua energia. Não estava conseguindo sentir nada. Um esboço de sentimento qualquer. Queria sentir. Queria espernear, chorar, arrancar os cabelos, mas não. Não sentiu nada. Absolutamente nada. Só a certeza de que se existe algo que possa dar errado, certamente DARÁ!

E assim, apática, foi arrastando suas malas e suas olheiras de volta pra casa, enquanto evitava encostar nas pessoas que passavam frenéticas ao seu lado. Entrou novamente no taxi. “De volta pra casa, por favor,”. “Que foi, a Madame esqueceu a passagem?”. Um sorrisinho amarelo foi tudo que conseguiu dar. Olhou para o lado de fora e se concentrou no percurso exato que tinha feito há poucos minutos atrás. O mesmo percurso que só imaginara fazer outra vez em quatro dias.

Chegou em casa, largou as malas num canto do quarto, arrancou os sapatos e colocou o cd da Billie Holiday pra tocar em volume máximo. Sua companheira de sempre. "You know that I love you / and what love induzes". Era incrível a capacidade que essas músicas tinham de lhe fazer sentir mais mulher, mais carne, mais pulso, mais vida, e com uma vontade intensa de beber uma garrafa inteira de vinho. Só as duas, Ana e Billie, bebendo vinho, rindo, sacudindo os quadris, fumando alguns cigarros, e chorando dores nostálgicas de amores perdidos. Só aquela voz, entendia tudo que se passava pela cabeça dela. Olhou para cama, onde tinha algumas roupas dobradas. "Tenho que guardar isso depois".

Ana só pensava em se deitar. E como a cama estava ocupada, contentou-se em colocar algumas almofadas sobre o tapete, a taça de vinho ao lado, e bastava. Deitou-se e tentou sentir alguma coisa, o que quer que fosse. Dor, mágoa, frustração, qualquer coisa. Estava tão apática que não conseguia sentir qualquer fragmento de sentimento. Algo que a fizesse se perceber. Mas não. Nada. Nem uma pontinha de sentimento. Só sentia mesmo aquela voz suave entrando pelos seus poros e lhe dando a sensação de sono. O estresse acorrentado ao corpo impunha uma vontade de desabafar, deitar, abraçar o travesseiro e ter uma noite Bukowiskiana cantada por Billie Holiday.

Os olhos estavam estáticos em um ponto qualquer do azulejo branco do chão. Tão estáticos quanto o celular. O maldito celular que a perturbara por ficar tantas noites mudo, agora, lhe fazia um favor por quietar-se. Não queria falar com ninguém, não queria explicar-se a ninguém. E mesmo assim, nem um barulho poderia atrapalhar o som ecoando pelo quarto junto ao cheiro forte do incenso que prometia "sexo, amor e aconchego", o que de fato lhe seria de extremo agrado, mas achou melhor apagar o incenso já aceso e usar um que vinha prometendo na caixa: "ajuda a vencer obstáculos". Seria esse então. Um blues com cheiro de obstáculos vencidos.
Só faltava uma única coisa: a torta de chocolate! Aquela mesma que ela havia negado por varias semanas no intuito de perder alguns quilos. Agora já não importava mais. Comeria aquela torta sem culpa e com vontade máxima de manchar aqueles malditos lençóis brancos - onde o menino gato se espreguiçava - com o chocolate que escorreria pelo garfo. Parou por alguns segundos e com a cabeça encostada no armário, já sentindo o efeito do vinho, Ana respirou fundo e constatou que a sua vida nunca teria tido sentido se não fosse o som daqueles pianos. "Me casaria com esses pianos se pudesse".

"Não se afobe não que nada é pra já..."Olhou pro lado tentando adivinhar de onde estaria vindo aquela música. Mas aquelas palavras lhe bateram com um peso tão grande que a busca foi esquecida. "Ô Chico, Chico, Chico, como pude esquecer de ti? Que me curou tantas vezes pronunciando essas breves palavras 'Não se afobe não que nada é pra já'". Só então, Ana viu o celular jogado na cama e percebeu que era ele que tocava. Não atendeu. Nem ao menos se importou em ver quem ligava. Ficou ali ouvindo as palavras milagrosas de Chico misturadas aos teclados bêbados do som de Billie. E de repente a apaticidade começou a evaporar. Já sentia cada nota das duas músicas que tocavam simultaneamente. Cada pedaço do seu corpo vibrava ao som do romance inédito entre Billie Holiday e Chico Buarque.

Olhar perdido. Chico calou-se - desistiram de ligar. Ana olhou mais uma vez para as roupas em cima da cama e depois para as malas no canto do quarto, e viu que só seus sonhos estiveram ali, naquelas malas, ela não. Ela ficara presa aos Chicos, às Billies, e a tantos outros que embalaram seus momentos mais difíceis e os mais românticos e patéticos também. Tinha ficado presa às melodias. Melodias que sempre vinham para lhe entregar algum tipo de sensação. E jogada no chão, perto do cinzeiro, tomou mais um gole - direto na garrafa e grande o suficiente para esvaziá-la -encolheu-se no travesseiro em cima do tapete, e sentiu falta de ter alguém com quem pudesse se enroscar. Acabou dormindo. Desejando que o dia seguinte lhe trouxesse um pouco de paz e, principalmente, a sensação de que o menino gato e seus lençóis brancos tivessem sido apenas um sonho. E nada mais."

[Continua..]

quinta-feira, 16 de julho de 2009

Quem conta um conto..

"A noite enorme.Tudo dorme.Menos o teu nome" [Leminski]


Pensamentos maldosos haviam lhe tirado o sono. E já que estava acordada, Ana foi à cozinha, comeu alguma coisa, preparou um café (se não iria mais dormir precisaria de um pouco de cafeína pra agüentar o dia seguinte, que estava quase chegando), pensou primeiro na mala que tinha que ter feito hoje e deixou pra amanhã, e depois no menino. "O que será que ele está fazendo agora?”. Olhou o relógio. 4h30 da madrugada. “Provavelmente dormindo”. E o imaginou deitado sobre lençóis brancos, se esticando na cama, dando a idéia de sono profundo. O menino das noites em claro, de motivos de insônia e saudade profunda.

4h55 da manhã e o único barulho no quarto é o do relógio. Maldito barulho, pensou. Deu mais um gole na xícara de café pra alimentar a insônia, folheou o livro jogado na escrivaninha e olhou algumas vezes para o lado. Pijama de moletom, cabelo preso em nó, meias de pares trocados nos pés, e o tic-e-tac do relógio lembrando-a de que seria impossível dormir esta noite. Mas, ainda assim, por pura teimosia, deitou novamente. Visualizou o menino enrolado nos lençóis mais uma vez e inevitavelmente, aqueles pensamentos voltaram a ocupar espaço na sua cabeça. Eles já se conheciam. Tinham se esbarrado debaixo de chuva no meio da multidão de um show em uma cidade que não era nem a dele nem a dela. Duas vidas de repente cruzadas ali, por puro mistério, por puro acidente. E com a mesma simplicidade que se encontraram, partiram. Cada um para um lado, cada um para uma cidade. Se auto boicotaram porque sabiam que um dia iriam querer mais.

Ironicamente, resistindo à distância, ao afastamento e todas as intempéries do destino (ou do acaso), não perderam o contato. Falaram de músicas, de livros, e da preguiça em comum, e dos medos em comum. Eles já se conheciam, mas saber que estaria em poucas horas cara a cara com ele deixava Ana realmente insegura. Ela se culpava pela torta de chocolate que tinha comido de sobremesa no almoço e morria de medo que ele não sentisse aquelas coisas que só se sente quando está do lado da pessoa. E se isso acontecesse, a culpa seria da torta de chocolate!

5h30 da manhã. Rolou na cama se sufocando de saudade e confusão. Aceitaria de bom grado que ele aparecesse ali agora dizendo no seu ouvido que ela não precisa ter medo de nada. Sentiu vontade de ligar, mas continuou ali, deitada, vítima da própria insegurança. Tic-tac. O barulho do relógio agora parecia soar absurdamente alto, como se quisesse abafar os pensamentos que ecoavam pelo quarto. Folheou outra vez o livro na escrivaninha, olhou para o teto, pro chão, mais algumas vezes pros lados e encarou o celular estático. Sem conseguir controlar o impulso uma segunda vez, ligou. E com a voz trêmula, denunciando uma vontade de encontrá-lo tão imensa quanto a sua insônia, disse que sentia saudade.

Tentou manter a calma, para que ele achasse que ela era uma mulher controlada e madura, mas ele ria de seus medos e tentava convencê-la de que ficaria tudo bem. Ana fechou os olhos, então, tentando imaginar a boca do menino sorrindo do outro lado da linha e teve vontade de atravessar o telefeno e ir ao seu encontro. Quando desligou, o medo tinha sumido. Sabia que ia doer, mas ela queria.

6h da manhã. Olhou pela janela e viu que o dia estava amanhecendo. Fazia uma manhã fresca de inverno 'non sense' do Espírito Santo. Desperta, foi pra janela ver o sol nascer, desejou que aqueles 4 dias que passaria ao lado dele se multiplicassem e não se preocupou mais em dormir. Sabia que em algumas horas poderia deitar em cima daqueles lençóis brancos onde o menino se estica dando a idéia de sono profundo. “E que sejamos felizes agora, que é bem melhor do que pra sempre”. Destino ou acaso, que seja, ela sabia que de alguma forma tinha que ser assim. E com o coração explodindo, Ana fez as malas e foi, sem nem ao menos pensar como é que vai ser quando daqui há um mês ela quiser tudo outra vez...

[Continua...]

domingo, 12 de julho de 2009

O que é o amor??


Sabia que uma hora esse dia iria chegar! Acho que esperei minha vida inteira para responder a esta pergunta! E digo que ainda não sei se sei a resposta, ou, mais ainda, se algum ser humano em algum momento soube realmente responder o que venha a ser o amor. Confesso que quando o assunto é amor, nada sei de concreto. Mas se, como eu disse no post anterior, o que importa é escrever para fazer as pessoas refletirem e mudarem, nada mais apropriado do que falar do amor. Afinal quem nunca perdeu bons minutos matutando sobre o que vem a sê-lo?!

Comecei a refletir sobre isto quando tive uma conversa com minha irmã sobre um casal que conhecemos que está junto há 10 anos, mas não há amor. Ela está com ele porque queria ser mãe. Ele está com ela porque o status social dela lhe convém. Ambos conhecem os motivos do outro e ainda assim convivem em harmonia. Há uma década! Um casamento sem ciúmes, sem (muitas) brigas, sem paranóia e sem amor. Perceba que estou me referindo aqui àquele amor romântico, mitológico, “de comercial de margarina” e de filmes de Hollywood. Casamento sem amor. Estranho? Pra mim também é. Só que diante do fato não poderia deixar de ponderar qual a verdadeira importância do amor para a duração de um relacionamento.

Para explicar a conclusão que cheguei, só começando do começo (obviamente.. rsrs...). Primeiro, influenciados pela mídia, que prega a supervalorização da sedução e da conquista, e pela sociedade contemporânea imediatista, saímos por aí em busca do nosso amor perfeito e como se isso já não fosse tarefa suficientemente difícil, queremos pra AGORA! Fazemos uma lista com nossos ideais de prazer e alegria, nossas exigências, nossas expectativas, nossas, nossas e só nossas. De repente a gente pisca e, BUM, estamos apaixonados. Não porque aquela pessoa nos faz bem e sim porque precisamos de alguém que NOS ame e que venha a superar NOSSAS expectativas. Passamos a precisar do outro pra ser feliz, entregamos o nosso desejo de ser amado e a ânsia de ser visto, tocado e adorado. Deixamos de ser algo inteiro pra ser metade, uma vez que a nossa felicidade para existir depende do querer do outro.

O problema é que a expectativa excessiva produz intolerância, ansiedade, angustia e paranóia, além de impulsos neuróticos que nos fazem ligar 125425752 vezes por dia! Daí pra frente só existe um caminho, a paixão diminuir e o relacionamento ficar mais morno, mais apático e principalmente mais racional. Começam a aparecer os erros e falhas da pessoa “amada”, e junto com elas nossas frustrações. Ninguém quer abrir mão de nada e muito menos aceitar que a dor também faz parte da condição humana. Dor e frustração passam a ser indicadores da insuficiência daquele sujeito de te amar da forma que você queria. Em outras palavras, ao menor obstáculo, já partimos pra outra.

A verdade é que este tipo de relação não está embasada no amor, mas sim na paixão. E costumamos nos confundir bastante a respeito disso. Esquecemos que a paixão é fruto do imaginário, do surreal, é a forma como reagimos há algo novo e que queremos conquistar. O amor, por outro lado, só sobrevive no campo da realidade. No começo, existe um fogo novo, tudo muito excitante e animador. Mas logo isso se apaga e volta-se ao que era antes. E é ai que a brincadeira começa a ficar divertida! Paixão, sentimos a mesma por qualquer pessoa que seja, e as vezes transportamos uma paixão para a primeira pessoa que passa só para poder dizer ESTOU APAIXONADO. Amor não. Ele acontece quando conseguimos ver, conhecer e principalmente conviver com as peculiaridades da pessoa que escolhemos, com todas as suas manias e defeitos.

Amar não é ser totalmente dependente da outra pessoa pra ser feliz, é ter a certeza de que esta pessoa não é pré-requisito para a sua felicidade e ainda assim ter o desejo e a disposição de estar junto. É saber que fatalmente você encontrará dezenas de pessoas mais bonitas e mais inteligentes do que a que está do seu lado, mas você decidiu amá-la por algum motivo, e enquanto mantiver essa decisão, nada superará a vontade de ficar junto. Nem a distancia, nem as diferenças, nem nada! Porque amar não é sentimento, amar é escolha! O amor é o ato de querer ficar com o outro. Decisão consciente, leve, sábia e madura. E quando entendemos isso a leveza da relação surge, porque finalmente percebemos que a paixão é uma coisa insignificante perto do desejo de, ainda que livres pra ir, encontrar alguém que nos faça querer ficar!

Em resumo, acertou quem disse: "os dispostos se atraem"...

sexta-feira, 3 de julho de 2009

(Não) parece que foi ontem!

(Não) parece que foi ontem desde a última vez que escrevi aqui. Entretanto muita coisa mudou. Nunca deixei de escrever. Ainda sou viciada em papel. Escrevo em papel. E quem escreve sabe como é gostosa a sensação de “parir” uma boa idéia ou um bom texto. Mas ultimamente não tenho gostado de nada que escrevo. Escrever no blog é ainda mais difícil! Aqui, é muito mais do que dar a cara a tapa, é oferecê-la a mãos que você nem ao menos conhece. Exposto demais para as idéias medíocres que ando tendo.

O que mais temos atualmente são informações disponíveis, variados tipos de blogs e blogueiros. Então como escolher um tema? Como escrever algo que dê ao leitor uma sensação de “VALEU A PENA”? Ou mais ainda, que o leve a refletir, a mudar e que acrescente algo na vida daquela pessoa? Informação. E mais informação. Somos por excelência a união das informações que obtivemos durante a nossa vida. Nossa personalidade é reflexo daquilo que sabemos sobre o mundo e da criticidade que usamos para analisar os fatos. Mas realmente não é pra dar informação que gosto de escrever. Se fosse este o caso não teria desistido do Jornalismo. Quero falar de como reajo ao mundo ao meu redor e não no que está acontecendo com ele!

Às vezes é preciso esvaziar o velho pra dar espaço pro novo. Já não me sinto mais um poço de cultura e informação como me sentia na época em que comecei a dar os primeiros passos aqui no blog. Mas gosto do nome. E, portanto o manterei. CULTURA IMPURA! Tenho medo de que vire um diário, mas é mais fácil falar daquilo que sentimos. Na verdade, ando sentindo menos e talvez por isso escrevendo menos. Confesso estar menos inquieta também. O tempo tirou um pouco a ânsia das coisas e a minha vontade de abraçar o mundo. Hoje me sinto no meio. Sou intermédio entre aquilo que sou, aquilo que mostro e aquilo que queria ser. Mas apesar de o tempo ter me mostrado a possibilidade da quietude, me deparo agora em meio a papeis e palavras. Palavras que pediram pra sair ainda que em um texto sem estrutura e sem um tema definido. E a verdade é que poder escrever sobre o que quer que seja - seja pra vários leitores, pra apenas um ou pras paredes, que seja - me permite dormir sabendo que minha vida pode ser tudo, menos ordinária.