sábado, 17 de setembro de 2011

"Que bom é bom demais pra ser aqui..."

Vitorinha ontem sorriu. Sorriu pra dentro, pra si. Sorriso de ilha que se cerca pra proteger todo tipo de gente que se encontra aqui. Inclusive ela, as putas de camburi, os pombos na calçada e os loucos da madrugada. E ai fica fácil pertencer a cidade. E a um monte de gente também. Fica fácil perambular pelas ruas e pelos corações alheios, amar a todos ao mesmo tempo, e se dividir entre sabores. Se dividir entre a doçura das coisas que vêm aos poucos e a acidez das que chegam aos montes. Porque ontem a cidade estava sorrindo, sambando e suando. Estava transparecendo no olhar que deixava escorrer pelos poros qualquer forma de preocupação, qualquer motivo de tristeza ou solidão. E enquanto suas pessoas se ajeitavam em um estado de samba interno, ela ria de felicidade. Só não da pra dizer quem riu mais, se foi ela ou se foi a cidade.

terça-feira, 13 de setembro de 2011

Aliens

Eu nunca vi um alien no meu quintal. Alias, não sei muito bem como as coisas funcionam depois do muro que cerca a minha casa, para além dos limites da minha rua. Daqui do meu quintal, nem um sinal. Nem uma dica se quer. Apenas um sol enganador do lado de fora da varanda. Daqueles amarelos e estupidamente claros, mas que gelam as pontas dos dedos e do nariz. E que te fazem ficar em dúvida se vai pra rua ou se fica em casa, jogado no sofá. O sol que engana, a mente que engana, e a mania inútil do ser humano de querer provar sempre que sabe mais do se deve. De repetir em voz alta, incansavelmente, falsas verdades, pra ver se assim elas começam a fazer algum sentido. Não sei direito como as coisas funcionam do lado de fora, mas me irritam pessoas que não fazem a mínima idéia do que acontece dentro delas. Porque a luz do sol de inverno é sépia, mas a claridade incerta de quem não se conhece é preta e branca.

domingo, 11 de setembro de 2011

"Na rua deserta de rumores: domingo." Caio F.



Antes era assim. Quando eu dizia alguma coisa, ele olhava primeiro pra minha boca, depois pra mim. Um gesto distraído de quem se vira pra prestar atenção no que a outra pessoa vai dizer e demora pra encontrar um ponto fixo pro olhar. Por pura distração. Eu sabia. Mas o meu corpo reagia àquilo sem pensar. De lá pra cá, eu mudei pouco. Ele mudou demais. Não sei se por genética, radiação ou por obra do satanás. Mas eu que desconfiava tanto do seu potencial pra loucura, parei de duvidar. Porque hoje ele é desses que sabem que o segredo está na própria malandragem. Que aprendeu a usar meia dúzia de palavras difíceis e a jorrar por ai filosofias baratas de mesa de bar. Mais um cheio de músicas tristes e histórias complicadas sobre mulheres caóticas e confusas que passam pelo seu sofá. Enquanto eu mudei pouco, ele mudou demais. Eu continuo sentada com aquele meu livro que há anos eu leio, sem saber quem vai morrer no final. Já ele, encheu os cinzeiros, mudou de roupa, de cabelo, de conversas e até a forma de sentar. Mas quando eu falo, ele ainda se distrai e olha primeiro pra minha boca. E meu corpo, meu corpo continua reagindo a isso sem pensar...